sábado, 24 de setembro de 2011

MANEJO ESTRATÉGICO DA PASTAGEM



Introdução
À exemplo do que acontece no Brasil, a produção de leite e de carne no sudoeste da Bahia é feita predominantemente à pasto. Além de ser a fonte de alimentação mais econômica, esse sistema de produção tem credenciado o país na exportação de carne e seus derivados, gerando expectativas para que o volume exportado em 2005 atinja oito bilhões de dólares, com crescimento de 25% em relação ao ano anterior.

O sudoeste da Bahia apresenta condições edafoclimáticas ideais para produção a pasto. Em adição à tecnologia disponível representada principalmente pela disponibilidade de genótipo de forrageiras e de técnicas de manejo das pastagens, qualidade genética do rebanho e controle sanitário, já conferem à pecuária regional potencial para obtenção de elevados índices de produtividade.

Infelizmente a produtividade média regional ainda é baixa. A produção de leite por vaca embora tenha experimentado melhoras, ainda está entre 800 a 1000 litros/vaca/lactação, correspondendo a 1000 kg de leite/ha/ano. Quanto ao gado de corte a produtividade está entre 5 a 6 @/ha/ano. Esses índices são ainda insignificantes e bem abaixo da potencialidade tecnológica e dos agrossistemas pastoris que compõem a região. Dispõem-se de tecnologias zootécnica e de gerenciamento da produção, suficiente para obtenção de cerca de 6.480 kg de leite/ha/ano, para gado de leite e 20 @ de carcaça/ha/ano para o gado de corte. Em explorações mais intensivas a tecnologia disponível potencializa o alcance de respectivamente 21.500 kg de leite/ha/ano e 35 @ de carcaça/ha/ano. Resta analisar os fatores que limitam, a adoção dessas técnicas por um número maior de produtores de modo a melhorarem sua renda e contribuírem para melhorar os

Escolha da forrageira
A produtividade da pecuária à pasto está diretamente relacionada com o potencial da forrageira, sua adaptabilidade ao ecossistema e principalmente com o manejo adotado. As forrageiras, quanto à sua exigência nutricional e conseqüentemente resposta à adubação podem ser classificadas em três grupos, apresentados na Tabela 1.

Tabela 1 – Classificação das forrageiras quanto à exigência nutricional.

Grupos
Forrageiras
Grupo 1: elevada exigência nutricional
Capins: elefante, tifton, coastcross, tanzânia, mombaça, colonião.
Leguminosas:soja perene, leucena.
Grupo 2: Média exigência nutricional
Capins: braquiarão ou marandu, xaraés, jaraguá, ruziziensis, braquiária-de-brejo, estrela africana.
Leguminosas: centrocema, siratro, , tropical, guandu, amendoim forrageiro.
Grupo 3: Baixa exigência nutricional
Capins: gordura, braquiária comum (B. decumbens), humidicola, B. dictyoneura, andropogon.
Leguminosas: stylozanthes (mineirão), desmodium cv. Itabela, calopogônio, cudzu tropical.


É fundamental que na fazenda sejam atribuídas às áreas mais férteis forrageiras mais exigentes e produtivas. O plantio de forrageiras mais exigentes em solos pobres implica necessariamente na adubação da pastagem para que não haja queda de produtividade seguida da sua degradação. O capim–humidicola estabelecido em solo de tabuleiros costeiros necessitaria pouquíssima adubação fosfatada para produzir satisfatoriamente, já o capim-braquiarão (marandu), nessas mesmas condições, necessitaria de calagem, maior dosagem de fósforo, além nitrogênio e potássio.

Além da exigência nutricional outro fator importante na escolha da forrageira é a sua adaptabilidade às condições de excessiva umidade do solo e capacidade de cobertura do solo. Para áreas sujeitas a alagamento deve-se preferir os capins, braquiaria-de-brejo, capim-bengo, humidicola e estrela africana, ordenados de acordo com o nível de tolerância. Áreas com topografia muito acidentada, devem preferentemente ser deixadas como áreas de reserva permanente. Nas áreas medianamente acidentadas devem ser utilizadas forrageiras estoloníferas/decumbentes como é o caso de alguns capins dos gêneros Brachiaria (decumbens e humidicola) e do Cynodon (coastcross, tifton).

Na história da pecuária brasileira tem sido comum a substituição de forrageiras mais exigentes em fertilidade de solos, portanto mais produtivas, por forrageiras menos exigentes, a medida que se observa a queda da fertilidade do solo. Com isso acontece um verdadeiro retrocesso, com redução de produtividade, sem evitar que com o passar do tempo, ocorra a degradação da pastagem. Nesse caso é preferível não substituir a forrageira, mas sim proceder a reposição dos nutrientes, seguida do manejo adequado da pastagem. O mais grave também acontece, substituir forrageira de baixa exigência nutricional em pastagens degradadas por outra mais exigente sem o correspondente uso de fertilizante e manejo adequado.

Manejo da pastagem
O correto manejo das pastagens é fundamental para garantir a produtividade sustentável do sistema de produção e do agronegócio. Atrelados ao bom manejo estão a conservação dos recursos ambientais, evitando ou minimizando os impactos negativos da erosão, compactação e baixa infiltração de água no solo, de ocorrência comum em áreas mal manejadas e/ou degradadas. O manejo incorreto das pastagens é o principal responsável pela alta proporção de pastagens degradadas observada em todas as regiões do Brasil.

O princípio básico do bom manejo é manter o equilíbrio entre a taxa de lotação e a taxa de acúmulo de massa forrageira, ou seja, a oferta de forragem (quantidade e qualidade). Para atender esse pré-requisito é necessário compreender a dinâmica dos componentes do ecossistema de pastagem: forrageira (potencial produtivo, taxa de crescimento, adaptabilidade), solo (fertilidade, textura, topografia) clima, animal (comportamento ingestivo, taxa de lotação). A taxa de lotação, o número de cabeças/ha, novilhos/ha, vacas/ha ou UA/ha ( UA= unidade animal = 450 kg de PV), deve variar dentro e entre estações do ano em função da oferta de forragem. Essa oferta depende da taxa de crescimento das forrageiras que por sua vez, varia em função do clima (chuva, temperatura, radiação solar). No sudoeste da Bahia observa-se variação nas taxas de crescimento entre estação e nas diferentes ecoregiões. Na ecoregião de Itapetinga observa-se um período seco bem definido. Na ecoregião do extremo sul observa-se um inverno chuvoso, mas as baixas temperaturas observadas nesse período (junho a agosto), reduzem a taxa de crescimento das forrageiras (Tabela 2) sugerindo redução na taxa de lotação ou suplementação com volumoso nesse período.
 
Tabela 2 – Taxa de crescimento observada para gramíneas e leguminosas forrageiras no extremo sul da Bahia.

Forrageiras
Mínima precipitação
Máxima precipitação

Kg/ha/dia
Gramínea(1)
37,9
91,5
Leguminosas(2)
13,3
41,7

(1) Média de 5 espécies ou cultivares.
(2) Média de 5 espécies ou cultivares.
Fonte: PEREIRA, et al. (1995)


No manejo das pastagens existem basicamente dois sistemas de pastejo: o pastejo contínuo (lotação contínua) e o pastejo rotacionado (lotação rotacionada). Os demais são derivações do pastejo rotacionado, tais como pastejo alternado, pastejo diferido, etc. Esses sistemas de pastejo estão representados na Figura 1.

Forrageiras
Período de descanso (dias)
Altura do pasto (cm)
Entrada
Saída
Capim-elefante
36
110 - 120
40 – 50
Colonião, tanzânia, mombaça
36
70 - 80
30 – 40
Braquiarão, xaraés
36
40 – 50
20 – 25
Brachiaria decumbens
28
30 – 40
15 – 20
Capim humidicola, tifton 85, coastcross, estrela africana
21 – 28
20 – 30
10 - 12


O período de ocupação (PO), é o tempo que os animais ficam pastejando em cada piquete. A sua duração deve ser compatível com a oferta de forragem acumulada e esta é realmente quem define a taxa de lotação pretendida. Na definição do período de ocupação também deve ser observado o resíduo pós-pastejo, que deve ser adequado para garantir a rebrotação no período de descanso seguinte. Sugestões sobre alturas de resíduos para algumas forrageiras são apresentadas na Tabela 3. O PO nunca deve exceder a 7 dias. O ideal é que fique entre 1 e 3 dias para gado de leite e 3 a 5 dias para gado de corte, dependendo da intensidade e do potencial de produção dos animais. O gado de leite é mais sensível a períodos de ocupação mais longos, pois a medida que passam os dias a produção de leite cai. Assim, para vacas com produção acima de 12 kg de leite/dia, o ideal é adotar PO de 1 dia.

O tamanho do piquete depende do número de animais definido em função da oferta de forragem, do período de ocupação e da área total disponível para o sistema. A área dos piquetes não deve ser necessariamente a mesma. O importante é que a disponibilidade de forragem dentro do piquete, ou seja a área útil. Piquetes com topografia muita acidentada ou com áreas alagadas, pedras, etc. devem ser maiores. Deve-se fazer uma divisão agronômica/zootécnica da pastagem e não uma divisão meramente topográfica. O número de piquetes quando se tem somente um lote por sistema de pastejo é calculado pelo quociente do PD pelo PO, somado a 1. O uso de mais de um lote em um mesmo sistema de pastejo é mais difícil de ajustar, devendo ser evitado.

Deve-se preferir piquetes na forma quadrada ou retangular, com a largura mínima igual a um terço do comprimento. O planejamento do sistema deve ser feito por técnico especializado em manejo de pastagem. Corredores, bebedouros, cochos saleiros ou para suplementação, áreas de descanso, devem ser alocados de modo a reduzir e tornar mais o cômodo possível o percurso dos animais. Em área acidentada, os corredores devem ser projetados cortando o declive, a fim de evitar a erosão e amenizar o esforço dos animais. Isso se torna mais importante ainda em gado leiteiro, onde a posição do estábulo/sala de ordenha deve também ser levada em consideração no planejamento do sistema de partejo. Uma vaca leiteira deixa de produzir cerca de 0,5 litro de leite/dia para cada quilometro percorrido em terreno plano. Em área acidentada essa redução pode triplicar. O arranjo de sistema de partejo com lotação rotacionada mais utilizado é aquele que adota uma área de descanso (do piquete do animal), onde são alocados os bebedouros (ou aproveitamento de corpos de água naturais), cochos saleiros, com livre acesso dos animais a partir do piquete que estão utilizando. De acordo o tamanho dos piquetes e área total do sistema pode haver de uma a várias áreas de descanso.

O nível de produtividade obtido no sistema de partejo está diretamente relacionado com a fertilidade do solo ou com o nível de adubação adotado e com o potencial de resposta da forrageira. Para forragens do grupo 1 (Tabela 1) o nível de fósforo no solo deve ser mantido em no mínimo 10 ppm. Utilizando-se os capins elefante e braquiarão e com adubação de 160 kg/ha de N, 60 kg/ha de K2O e 160 kg/ha de P2O5, em um sistema de partejo com lotação rotacionada (3 x 36 dias), na Essul/Ceplac, Itabela, obteve-se taxas de lotação, ganhos de peso diário e ganho de peso/ha de respectivamente, 4,6 e 4,1 UA/ha, 359 a 456 g/nov/dia e 785 e 756 kg/ha, no período de 385 dias (PEREIRA, et al. 2005). Níveis de N de 200/300 kg possibilitam a obtenção de 1000 kg/ha de PV ou 33@/ha.

No entanto, com bom manejo e com baixos níveis de nutrientes pode-se obter produções bem superiores à média regional. Adubação de 20 kg/ha de P2O5 e 90 kg/ha de N em pastagens de B. humidicola, em solos quatzosos (Faz. Barra dos Manguinhos, Ilhéus, BA) e de tabuleiros costeiros do sul da Bahia (Ceplac/Essul, Itabela) possibilitaram respectivamente a obtenção de 20 kg de leite/ha/dia e de 16 a 24 @/há (PEREIRA et al., 1996). Na consorciação dessa gramínea ou do Brachiaria dictyoneura com amendoim forrageiro cv Belmonte, sem adubação nitrogenada, obteve-se produção semelhante com o uso de novilhos de corte (SANTANA et al., 1998).

Considerações finais
Com a adoção de manejo estratégico das pastagens é possível elevar consideravelmente a sua produtividade e manter a sustentabilidade do sistema de produção. O uso de adubação implica no refinamento maior desse manejo, a fim de aumentar a eficiência do adubo aplicado.

Na condução de qualquer sistema deve ser respeitada a variação na taxa de crescimento da forrageira, adequando a taxa de lotação ao acumulo de forragem promovido por esse crescimento. A definição das varáveis de manejo mencionada deve ter uma certa flexibilidade para ser ajustado de acordo com as peculiaridades de cada forrageira, condições edafoclimáticas da região e intensividade do sistema de produção.

Literatura citada
RODRIGUES, R. de A. R. Conceituação e modalidades de sistemas intensivos de pastejo rotacionado. In: Simpósio sobre manejo de pastagem, 14. 1997, Piracicaba. Anais... Piracicaba: FEALQ. p. 1-24.

PEREIRA, J. M.; REZENDE, C. de P. e MORENO, M. A. R. Pastagens no ecossistema Mata Atlântica: Atualidades e perspectivas. In: Reunião da Sociedade Brasileira de Zootecnia. Simpósio: Produção Animal e o Foco no Agronegócio. 42, 2005, Goiânia. Anais... Goiânia, SBZ. p. 36-55.

PEREIRA, J. M.; MORENO, R. M. A.; CANTARUTTI, R. B. et al. Crescimento e produtividade estacional de germoplasma forrageiro. In: Ceplac/Cepec (ed.) Informe de Pesquisa – 1987/1990. Ilhéus: Ceplac, 1995, p. 307-309.

PEREIRA, J. M.; SANTANA, J. R. de, & REZENDE, C. de P. Alternativa para aumentar o aporte de nitrogênio em pastagens formadas por capim humidícola. In: Reunião da Sociedade Brasileira de Zootecnia, 39, 1996, Fortaleza. Anais... Fortaleza: SBZ, 1996, p. 38-40.

SANTANA, J. R. de; PEREIRA, J. M.; REZENDE, C. de P. Avaliação da consorciação de Brachiaria dictyoneura Slopz. Com Arachis pintoi Kaprov & Gregory. sob pastejo. In: Reunião da Sociedade Brasileira de Zootecnia, 35. 1998. Botucatu. Anais... Botucatu: SBZ, 1998, p. 406-408.
 

José Marques Pereira Engº Agrº DS
Pesquisador da Ceplac/Cepec

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